Pesquisar as postagens

sexta-feira, 24 de novembro de 2017

FAÇA COMO O UNIVERSO, FIQUE FRIO


Enquanto nosso Universo se expande, a energia carregada pelos fótons decresce. Cerca de 380 mil anos após o Big Bang, sua temperatura ficou abaixo dos 3 mil graus, permitindo que prótons e o núcleos de hélio podiam capturar elétrons, introduzindo átomos do Universo. Com isso, os fótons passaram a contar com espaço suficiente para viajar sem se chocar com nada. O Universo finalmente ficou transparente, e assim surgiu o fundo cósmico de luz visível.

Este fundo ainda persiste, trata-se do resto da luz remanescente de um universo em desenvolvimento.
Os fótons, todos, viajam à mesma velocidade no vácuo: 300 mil km/s, a velocidade da luz. Aqueles que têm comprimentos de onda mais curtos, possuem maior freqüência, o que significa que possuem mais energia. Os fótons produzidos na parte do espectro dos raios gama e X se transformaram em fótons ultravioleta, luz visível e infravermelho. Conforme o comprimento de onda se alongava, eles ficavam mais frios e com menos energia.

Atualmente, 13,7 bilhões de anos depois, os fótons de fundo cósmico se deslocaram pelo espectro em direção às micro-ondas – daí a denominação comumente usada pelos astrônomos, “fundo cósmico de micro-ondas”. Mas a denominação que tem se firmado é “radiação cósmica de fundo”, ou CBR (cosmic background radiation). Futuramente, provavelmente será algo como “fundo cósmico de ondas de rádio”, em razão da redução ainda maior de suas freqüências.

Quando partes diferentes do universo se separam, os comprimentos de onda dos fótons na CBR devem aumentar: o cosmos estica essas ondas dentro do tecido elastano do espaço e tempo. Todos os fótons que circulam livremente perderão metade de sua energia original cada vez que o cosmos dobrar de tamanho.

O pico de produção de radiação de fundo cósmico ocorre num comprimento de onda de cerca de 1 milímetro, dentro da região de micro-ondas do espectro. A estática que se ouve num aparelho eletrônico provem de interferências de micro-ondas do ambiente, mas apenas uma pequena parte é CBR. As demais ondas são irradiadas pelo sol, por telefones celulares, por radares da polícia etc.    

O físico George Gamow e seus colegas previra a CBR na década de 1940. Dois físicos americanos, Ralph Alpher e Robert Herman, colaboradores de Gamow, estimaram pela primeira vez a temperatura do fundo cósmico.

O raciocínio desenvolvido surpreende por ser simples: o tecido do espaço-tempo era menor no passado, portanto mais quente. Estudando em retrospectiva, o Universo era tão quente que todos os núcleos atômicos ficaram desprovidos de elétrons, por estarem eles o tempo todo entrando em colisão com os fótons. Os cientistas perceberam que seria impossível aos fótons viajar livremente – para tal seria necessário ocorrer um prévio resfriamento do cosmos. Tendo esfriado, agora os elétrons poderiam ocupar uma órbita em torno dos núcleos atômicos – os átomos completos.

Em 1964, a CBR foi descoberta por Arno Penzias e Robert Wilson, da Bell Labs – futuramente agraciados com o Prêmio Nobel. Na década de 1960, o conhecimento das micro-ondas já era vulgar, mas não existiam antenas capazes de detectá-las. A Bell tinha uma dessas antenas, enorme e em forma de chifre, capaz de detectar micro-ondas provenientes de qualquer aparelho na Terra ou do espaço.

Penzias e Wilson tentavam criar um novo canal de comunicação para a Bell, para tanto procuravam mecanismos para filtrar os sinais, de forma a evitar qualquer interferência externa. Primeiro procuraram mapear a quantidade de interferência vinda do Sol, depois do centro da galáxia, de fontes terrestres etc. Essa medição-padrão buscava detectar sinais de micro-ondas.  

Mediram e corrigiram os dados de todas as fontes conhecidas de interferências. Mas sempre restava um ruído de fundo que nunca desaparecia. O ruído parecia vir de toda parte e não mudava com o tempo. Ao observar a antena gigantesca que usavam, viram alguns ninhos feitos por pombas dentro da antena. Limparam tudo, mas o sinal melhorou apenas um pouco. O artigo que publicaram em 1965 se referia mais ao inexplicável aumento de temperatura da antena do que ao sinal detectado sem explicação da fonte.
Outra equipe de pesquisadores, da Universidade de Princeton, simultaneamente construía um detector especificamente projetado para detectar a CBR, prevista por Gamow, Alpher e Herman. Mas, ao ler o artigo dos engenheiros do Bell Labs, os pesquisadores de Princeton puderam compreender do que se trata a tal “temperatura excessiva na antena”. Tudo fazia sentido agora: a temperatura, o fato de o sinal vir de todas as direções e com a mesma energia, o fato de não estarem sincronizados com a rotação e a translação da Terra...

E essas observações foram testadas? O composto chamado cianogênio – carbono + nitrogênio -, componente químico mortal usado em câmaras de gás, fica excitado quando em contato com as micro-ondas. São, portanto, termômetros cósmicos. Quanto mais quente a galáxia em relação à nossa, mais excitado fica o cianogênio que lá existe. Quanto mais jovem a galáxia, mais quente fica o cianogênio. E as medições feitas correspondem aos cálculos previstos.

Portanto sondar a radiação cósmica de fundo nos explica como surgiram as galáxias e os superaglomerados de galáxias. É possível até mesmo inferir a força da gravidade do Universo primitivo, apenas comparando as temperaturas e os tamanhos das áreas mais quentes e mais frias do Universo.

Assim, deduz-se quanta matéria comum, matéria escura e energia escura existe no Universo. Por curiosidade, os números são 4, 23 e 73 respectivamente. A matéria escura é uma substância de natureza desconhecida que produz gravidade, mas não interage com a luz. A energia escura induz a aceleração da expansão cósmica do Universo.

O mapa completo da CBR foi feito inicialmente para pequenos trechos do Universo por meio de balões telescópicos no pólo sul. Mais tarde, o mapa foi expandido para todo o céu, por meio de um satélite chamado Sonda de Anisotropia de Micro-Ondas Wilkinson – WMAP.    

Sim, estudar o Universo é uma ciência experimental.   
  

Rubem L. de F. Auto

Fonte: livro “Origens: catorze bilhões de anos de evolução”    


Nenhum comentário:

Postar um comentário